26 de setembro de 2016

4. Os Confins da Viagem


 

Desde minha partida,
tenho viajado entre os diferentes
tempos e continentes.
Indo e vindo, caminhando e navegando
com negros para as Américas
e amuletos e runas para a China.
Tudo passou
por mim: tesouros, especiarias,
influência e outras coisas que somam
a fortuna de um homem.

Que caminhos,
seus pés e braços terão aberto?

Aprendi a manipular
a espada do instinto e vesti
o elmo da intuição.
O tempo, sempre o tempo,
jogando com a sorte...

Que tesouros, meu bem tem guardado?

A fortuna da América,
um dia, naufragou.

Naufragou?

Isso mesmo, foi
por água abaixo!

Muito menos de quase nada
foi possível salvar. Intacta, apenas
a grande vontade de ainda ser
o Imperador do mundo.
Ah, eu não sabia... em primeiro lugar,
muito eu precisava ser
o Imperador de Mim!

Parte da aprendizagem,
parte desta viagem, chamem
como melhor entenderem,
fui parar nos confins do deserto,
sem companheiros, sem riqueza...
Apenas com bons planos e sonhos
e muita fome.

Que água lhe alivia a sede?
Que travesseiro lhe serve de apoio
nas horas de descanso?

No costado das ondas e dos camelos,
entre sábios antigos e modernos profetas
na companhia dos beduínos, viajei
entre o Marrocos e o Cairo.
Indo e vindo, caminhando
e navegando o passado, o presente e
a vida futura no oceano de areia,
meu deserto não se construiu
com solidão.
Encontrei oásis, tâmaras e jenipapos,
guerreiros e dançarinas.
Fui senhor em terra de cegos.

Que alguém lhe abrandaria
as mágoas?



* Peter O’Sagae. Peer Gynt – 4. Os confins da viagem.
 Do roteiro original inspirado na música de Edvard Grieg para a peça de Henrik Ibsen. Versos incidentais de Oswald de Andrade. Rádio USP FM, 1996. Noites poéticas, 1997.

Nenhum comentário:

Postar um comentário